O que é uma família? Supostamente, a resposta mais rápida seria "são as pessoas do meu sangue, a minha avó, tia, ...", pronto, isto tudo. Mas será mesmo apenas "essa" a nossa família? Então e os nossos melhores amigos, são o quê? Sempre me ensinaram que os nossos amigos são a família que nós escolhemos. Nós não tivemos a oportunidade de dizer "quero esta pessoa para minha mãe, aquela para meu pai...". Não, não tivemos essa opção. Então e eu? Eu sou filha de pais separados. Isso quer dizer que tenho, quê, três famílias? O lado materno, o lado paterno, e os meus amigos? Pois, nisso já eu acredito...
Acontece que, quando se é filho/a de pais separados, passamos a dividir e a multiplicar as coisas. Os eventos a dobrar, os presentes também... E a atenção que lhes damos passa a ser dividida; na maioria das vezes, mal.
Como a atenção é mal dividida, há consequências, que, por vezes, são graves. Começa pelo reflexo dessa mesma atenção.
Separadamente, os pais procuram um novo amor; umas vezes são bem sucedidos, outras não. Quando não são bem sucedidos, a consequência não é tão grave para nós, porque continuamos bem, continuamos a ter apoio familiar dos progenitores em si. Quando são bem sucedidos... Bem, isso já depende dos pais em si.
Há pais ou mães que, dependendo já dos precedentes das suas relações com os filhos, ou mantém a relação, ou passam a existir alterações significativas. Se a relação já de si for boa, continua na mesma. Claro que, nem tudo é um mar de rosas. Existirão sempre problemas, mas tudo se resolverá à sua maneira. Agora, para os filhos cujas relações com os pais já são de si algo tremidas... Receio que a coisa não fique muito melhor. Se não formos já maiores e não morarmos já sozinhos, seremos obrigados a escolher um deles com quem viver permanentemente, mesmo havendo custódia partilhada. E o que não for escolhido, vai sair magoado, e a partir daí as coisas tendem a piorar. Mas a pior fase não é essa.
A pior fase é quando acreditam ter encontrado o amor das suas vidas. Aí, as discussões tendem a piorar, a falta de atenção passa a ser muito maior. E o pior de tudo, é que mais nos parece que descemos uma categoria metafórica. Deixamos de ser o filho, passamos a ser um conhecido. As palavras carinhosas que deveriam implicar uma conversa a sério deixam praticamente de existir. Julgo que na maioria das vezes não o demonstramos, mas custa sempre no nosso interior. E pior será se, nessas alturas, nós próprios, filhos, estivermos a passar por uma má fase na nossa vida. Problemas escolares, uma paixão não correspondida, há de tudo e mais alguma coisa; e se juntarmos essa falta de atenção de um dos progenitores ao shake, ganhamos uma bebida com um mau sabor.
É terrível. Queremos que nos perguntem "mas estás mesmo bem? Conta-me o que se passa", mas não o fazem. Se for preciso, nem sequer dizem nada, dão-nos os bons dias e mais nada.
A reacção é quase sempre automática. Sentimo-nos revoltados, traídos. Ganhamos raiva ao progenitor em si, e a com quem ele/ela está. Achamos que nos roubaram alguém que é, de facto, nosso. É sangue do nosso sangue. Começamos a pensar, "se ele/ela é meu/minha «tal», porque tenho de abdicar disso obrigatoriamente quando não o quero fazer?". Sim, basicamente somos obrigados a deixar alguém que nos é algo, simplesmente porque esse alguém cegou, assim por dizer.
Eu não quero ofender ninguém, mas esta é a minha cruel visão do Mundo. É uma visão que não me agrada, que me entristece profundamente, porque as coisas não deveriam ser assim. É uma visão que me enoja ao ponto de me culpar, de pensar em tudo o que já fiz até à data e julgar que isto em si é uma consequência de algo do passado. Não sou nenhuma santa, mas será que eu, ou algum filho ou filha que esteja a passar por isto, merece? Que culpa temos nós? Será que já se esqueceram de uma célebre frase, nasceste sem pedir e morres sem querer? Nós não estávamos lá quando nos decidiram fazer, e se nos fizeram porque queriam mesmo mandar-nos vir ao Mundo, então, porque nos ignoram agora?
Eu tenho 19 anos, mas os mais novos que eu ressentem-se ainda mais, isso é certo. É duro para qualquer filho/a, até mesmo para os que são mais velhos e já estão a constituir família. A um filho/a pertence ter um pai e uma mãe, sejam separados ou não. Podem até ter um ódio de morte um ao outro, mas isso não pode toldar o julgamento que têm dos filhos. Devem sempre amar, apoiar, independentemente das asneiras que a gente faça. Devem estar presentes nas alturas em que são mesmo necessárias essas presenças, tenham coisas para fazer ou não, nem que tenham de faltar ao trabalho se for mesmo necessário. Eu, muito pessoalmente, só tenho esta pergunta: pai, porque é que decidiste vir no aniversário do meu primo, e faltar ao meu? Eu podia ter aguentado mais mês e meio, e tu também. Porquê?
Graças à minha mãe, tenho uma educação impecável. Sei dar o braço a torcer, sei quando me orgulhar e baixar a cabeça de vergonha, e acima de tudo, sei quando devo perdoar ou quando devo dar para trás. Isso, para mim, é mais importante que qualquer outra educação que eu poderia ter obtido se os meus pais estivessem ainda hoje juntos. Obtive o melhor que pude de ambas as partes, e acho que até não fiquei muito mal. Hoje em dia, às vezes penso onde é que eu poderia estar se nunca se tivessem separado, em todas as coisas que eu estaria a fazer, ou não.
Mas depois chego a uma óptima conclusão - se eles não se tivessem separado, eu não teria crescido tanto em tão pouco tempo, eu não seria quem eu sou hoje, e certamente não estaria a partilhar esta experiência com ninguém. Tenho de tirar proveito de tudo, até mesmo das coisas más, porque por vezes, são essas mesmas coisas más que nos ajudam a evoluir como seres humanos.
Mas de resto, só tenho a dar mais uns recados.
Obrigada Mãe, por teres sido pai e mãe; por me teres abraçado enquanto eu chorava vezes sem conta, fosse pelo meu pai, fosse por um amor infrutífero. A tua garra nos nossos maus momentos é a minha maior aliada intimamente, e quando for "grande", quero ser uma mulher de armas à séria como tu.
Obrigada Pai, por me teres aberto os olhos com tanta clareza. No meio de tantas bocas, eu acabei por crescer, e estou a tornar-me numa mulher, que quer ser como a minha mãe. Se não gostas dela, então nunca conseguirás gostar de mim incondicionalmente, como um pai deve fazer à sua única filha. No meio dos teus momentos amorosos, enquanto vivias a vida, praticamente esqueceste-te de mim, e de todas as promessas que me fizeste. Mas deixa lá, não quero o teu carro, hei-de ter o meu. Desculpa, mas é o que sinto, é a verdade.
E obrigada Andreia, por seres a minha melhor amiga - sem rótulos, se faz favor. Já o disse anteriormente, mas volto a repetir. És mais nova que eu, mas continuo a considerar-te a irmã mais velha que nunca tive.
♥
LINDO, LINDO, LINDO!
ResponderEliminarSentimento, é tudo o que prevalece no que escreves e ninguém melhor que tu para sentir tudo isto!
Ps: Obrigada pela dedicatória amor. Mesmo que não peças, estarei aqui para ti, sempre <3